segunda-feira, 17 de setembro de 2012

CIÚMES



Em A Ilha do Dia Anterior, Umberto Eco faz surgir em uma das reflexões o que segue: “Se o ciúme nasce do intenso amor, quem não sente ciúmes pela amada não é amante, ou ama de coração ligeiro, de modo que se sabe de amantes os quais, temendo que o seu amor se atenue, o alimentam procurando a todo custo razões de ciúme. Portanto, o ciumento (que, porém quer ou queria a amada casta e fiel) não quer nem pode pensá-la senão como digna de ciúme, e portanto culpada de traição, atiçando assim no sofrimento presente o prazer do amor ausente. (...) enquanto da nossa ausência estamos seguros, da presença daquele inimigo estamos, se não certos, pelo menos não necessariamente inseguros. O contato amoroso, que o ciumento imagina, é o único modo em que pode representar-se com verossimilhança um conúbio de outrem que, se não indubitável, é pelo menos possível, enquanto o seu próprio é impossível. Assim, o ciumento não é capaz, nem tem vontade, de imaginar o oposto do que teme, aliás só pode obter o prazer ampliando a sua própria dor, e sofrer pelo ampliado prazer de que se sabe excluído. Os prazeres do amor são males que se fazem desejar, onde coincidem a doçura e o martírio, e o amor é involuntária insânia, paraíso infernal e inferno celeste – em resumo, concórdia de ambicionados contrários, riso doloroso e friável diamante”.
E aqui Eco evidencia apenas mais uma faceta de um discurso emocional cujo horizonte acompanha a linha infinita dos oceanos distantes.
Revista: Filosofia nº 73  pág. 75
Autor:André Assis Barreto


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