sexta-feira, 28 de setembro de 2012

O tempo das cerejas...

(Luise Michel)

Quando cantarmos o tempo das cerejas,
será também a festa dos pássaros
As belas ficarão loucas de amor
e os apaixonados com os corações em brasa.
Quando cantarmos o tempo das cerejas,
O trinado dos pássaros será mais alegre

Mas é bem curto o tempo das cerejas,
onde nós dois sonhando iremos colhê-las
Das cerejas faremos brincos
Cerejas de amor caindo na terra
qual gotas de sangue

Mas é bem curto o tempo das cerejas,
Como pingentes de coral que colhemos nos sonhos

Quando cantarem o tempo das cerejas,
se tiverem medo das dores de amor, evitem a beleza
Eu que não temo as penas cruéis,
não viverei sem sofrer um dia.
Quando estiverem no tempo das cerejas
também vão sofrer as dores de amor.

Amarei para sempre o tempo das cerejas,
é desse tempo que guardo uma ferida aberta no coração.
Ganhei de presente a Dama da sorte,
que jamais poderá acalmar minha dor.
Amarei para sempre o tempo das cerejas,
e a lembrança que guardo no coração.

Poema de João Batista Clément
Dedicado á revolucionária Luise Michel.

Á revolucionária Luise Michel.

Deportada para a Nova Caledônia durante seis anos por sua atuação na Comuna, essa incansável militante passou para a posteridade somente depois de sua morte, em 1905.
Nascida em 1830, filha de um nobre e sua criada, que a educaram no culto da filosofia parisiense. Mudou-se para Paris onde foi lecionar. Ela se revelou na Comuna de Paris: foi enfermeira, organizou uma cantina para crianças e participou dos combates. Foi presa e condenada a oito ano de prisão, sendo seis de deportação para a Nova Caledônia. Enclausurada na Ilha Ducos, dedicou-se aos seus companheiros de infortúnio, mas também aos canacas (povo autóctone da Nova Caledônia), organizando enfermarias e dando aulas de alfabetização. Quando voltou a Paris em 1880, pronta para a luta, sempre vestida de negro – simbolizando seu luto pela Comuna e pelo revolucionário Théophille Ferré, fuzilado em 1871, que ela amou -, retomou suas atividade de militante, escreveu, participou de manifestações, deu conferências, e passou a integrar dois antes de sua morte, a loja maçônica do Direito Humano, a primeira obediência mista do mundo. Derrubada por uma pneumonia, Ela morreu no dia 9 de janeiro de 1905, em Marselha. Seu corpo foi levado para Paris e enterrado em Levallois-Perret. Segundo relatos da época, 100 mil pessoas seguiram seu féretro através de Paris. Foi para Louise Michel que Jean-Baptiste Clément, também communard, dedicou a canção Le temps de cerises. Essa música nostálgica sobre os amores perdidos havia sido composta alguns anos antes, mas ganhou um valor simbólico quando o autor, em 1885, acrescentou a seguinte dedicatória: “Á corajosa cidadã Louise, enfermeira da rua Fontaine-au-Roi, no domingo 28 de maio de 1871”. A canção tornou-se um hino revolucionário.

Autor: Denis Lefebre
Revista: História Viva pg. 72

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Formação Litúrgica Mistagógica


“Mistagogia” vem de uma composição de duas palavras gregas: “myst-“ e “agogein”. É uma palavra que indica uma prática muito antiga, redescoberta recentemente: guiar para dentro do mistério.
A própria liturgia nos guia para dentro do mistério que celebramos. Pla participação na ação ritual somos introduzidos/as, iniciados/as, mergulhados/a no mistério. A liturgia nos leva à experiência da fé através da participação nos “ritos e preces” (cf. SC, n.48). Todos os elementos e o dinamismo das celebrações (eucaristia e outros sacramentos, palavra, ofício divino...) nos levam à participação no mistério da vida, morte e glorificação de Jesus, o Cristo. Ajudam-nos a nos identificar com ele nas inúmeras atividades do dia-a-dia, nas escolhas decisivas que temos de fazer em determinados momentos, nas encruzilhadas da vida em que tudo nos parece obscuro e incompreensível, sem saída, sem perspectivas, assim como nos momentos de certeza, de júbilo, de paz, de alegria, de doação, de entrega.
É preciso que alguém nos ajude a perceber o caminho da participação espiritual, integral, de corpo, mente, coração, rumo ao mergulho no encontro com o Transcendente, com Deus, com o Cristo em sua morte-ressurreição, na profundidade da experiência ritual. A catequese mistagógica nos oferece os elementos para podermos entender, intuir o que acontece conosco na ação ritual. Trata-se de ajudar na simbolização, guiar na passagem do sinal material, “significante” (objeto, gesto, leitura, ação ritual), para a realidade teologal-espiritual significada e realizada pelo sinal, fazendo referência à história da salvação (experiências de vida vividas na fé). Aí entram a familiaridade com a Sagrada Escritura e o aprofundamento teológico, que culmina no encontro pessoal com Jesus Cristo, no momento atual, existencial de nossa vida pessoal, comunitária, social. A mistagogia nos leva a uma conversão da interioridade, a uma adesão existencial à pessoa nos leva a uma atitude ética, um modo de vida de acordo com o evangelho de Jesus Cristo.

Livro: Liturgia em Mutirão II

O Valor Litúrgico da palavra de Deus

É preciso tomar contato com a Palavra de Deus, sentir o prazer e a alegria de acolhê-la e meditá-la, saborear do seu conteúdo, pois alimentados por ela, conseguiremos dar o devido testemunho.
Sendo assim, despertamos para a importância da Liturgia da Palavra no contexto celebrativo. Primeiro recordamos que em toda ação litúrgica deve-se reservar um espaço para a proclamação e meditação desta Palavra. E neste sentido encontramos ainda nas Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil, n.62: “O anúncio e a acolhida da Palavra são, portanto, fundamentais para a vida e a missão da Igreja e ocupam lugar central na liturgia”. Salientamos ainda, a responsabilidade daquele que exerce o ministério da Palavra em nossas Comunidades Eclesiais, pois, “a proclamação da Palavra na liturgia torna-se para os fiéis a primeira e fundamental escola da fé. Por isso, é essencial que pastores e fiéis se empenhem para que a Palavra seja claramente anunciada nas celebrações ao longo do ano litúrgico, seja comentada e refletida com homilias cuidadosamente preparadas, encarnada na vida” (DGAE, n.62). A palavra escutada é dirigida a cada um e pede uma resposta pessoal.
Não podemos esquecer-nos da importância de uma boa reflexão a partir dos textos bíblicos iluminando a vida.
“A mesma celebração litúrgica, que se sustenta e se apóia principalmente na Palavra de Deus, converte-se num acontecimento novo e enriquece a palavra com uma nova interpretação e eficácia. Por isso a Igreja continua fielmente na Liturgia o mesmo sistema que usou Cristo na leitura a interpretação das Sagradas Escrituras, partindo do ‘hoje’ de seu acontecimento pessoal (cf. Lc 4,16-21;24,25-35;44-49)”

Livro:
                 Liturgia em Mutirão II  CNBB.

DIA DO IDOSO - 27/09 -


"Idoso é quem tem privilégio de viver uma longa vida... 
velho é quem perdeu a jovialidade.
 Você é idoso quando sonha... 
você é velho quando apenas dorme. 
Você é idoso ainda aprende... 
você é velho quando já nem ensina. 
Você é idoso quando tem planos...
 você é velho quando só tem saudade. 
Para o idoso a vida se renova a cada dia que começa... 
para o velho a vida se acaba a cada noite que termina.
Que você, quando idoso, viva uma vida longa,
 mas que nunca fique velho." 

A Melhor Idade
"Agora é tempo de sentir-se juntando as bordas do barco, Num circulo completo e pleno. Abrir as compotas do coração, Arrefecer o freio da razão, Não temer a imaginação, Ultrapassar o arco-íris da iniciação, Deixar de contabilizar a emoção. Estender os braços sem medo, Revelar pequenos segredos, Manter o peito aberto, Brincar com meus defeitos, Pedaços de meu mundo secreto. Abdicar de qualquer direito Pra driblar o preconceito. Jogar para o alto as inseguranças, Desvencilhar-se do peso das obrigações, Escrever novas e leves canções. Vestir asas nos pés alquebrados, Saber das palavras o significado. Ter várias e infinitas moradas Pra chegar sem hora marcada. Ser capaz de compreender Omitindo julgamentos. Abrir da porta o cadeado, Pois nada nos será tomado. Amar, amar, de todos os modos, Até mesmo do modo errado. Você me olha e se pergunta Onde está a lógica que conduz à vida, Se agora sente as regras as amarras, Sabendo que eu levei uma vida a desafiá-las Pra perceber, depois de tudo, Que podemos ignorá-las. Mas, se puder ler os meus olhos, Verá neles um manso espelho d'água Onde todas as lágrimas se transformaram Porque, embora eu não o soubesse, Todas elas eram abençoadas." 
                                                      Autor: ( M. Salete Interciso )

Universo Paralelo

Autora: Rosângela Chaves

Uma historieta que remonta à época medieval, quando as cidades européias eram protegidas por altos muros, narra um episódio divertido envolvendo um vigia de uma dessas fortificações. O tal personagem adora fazer brincadeiras de mau gosto e, um belo dia, resolveu pregar uma peça na população inteira do reino: soou um alarme falso anunciando que o inimigo se aproximava. A reação foi imediata e todo o povo se postou junto à muralha, em posição de defesa. Contaminado pela comoção geral, o vigilante fanfarrão acabou por se unir ao batalhão, pronto para a luta, acreditando na própria mentira.
Esse pequeno conto, como costuma acontecer com as histórias recolhidas da tradição oral, carrega um ensinamento moral. No caso, o de que o risco que corre todo mentiroso contumaz é de passar a crer nas invencionices que costuma espalhar, já que cria para si um universo de pura fantasia, em que realidade e ilusão não mais se distinguem. Esse perigo ainda é maior se ele encontrar pela frente uma platéia disposta a lhe dar crédito – uma mentira compartilhada é sempre uma ameaça muito mais poderosa à verdade do fatos -, como ilustra a anedota medieval sobre o sentinela trapalhão.
Com algumas adaptações, as lições desta antiga fábula podem valer para os nossos políticos, sobretudo em época de campanha eleitoral, Omo agora. Não é que eles, como o vigilante da história, estão sujeitos à possibilidade de começar acreditar piamente em tudo aquilo que prometem, nas ilusões que se habituaram a vender. A questão não é a crença deles próprios no conteúdo do que dizem, mas a fé que depositam no aparato que empregam. O problema está no paredão de autoengano que os candidatos erigiram em torno de si mesmos, convencidos como parece que estão de que os artifícios do marketing são suficientes para convencer os eleitores.
Resta saber até quando os eleitores vão concordar em continuar a ser esses espectadores passivos, ainda que desconfiados, desta encenação.

Jornal O Popular do dia 26 de setembro de 2012.

SONHO


Sonhei esta existência de venturas,
Sonhei que o mundo era só d’amor,
Não pensei que havia amarguras
E que no coração habita a dor.

Sonhei que m’afagavam s ternuras
de leda vida e que jamais pallôr
marcou na face  humana as desventuras
que a lei de Deus  impoz com rigor.

 Sonhei tudo azul e cor de rosa
E a sorte ostentando-se furiosa
Rasgou o sonho formoso que tive;

Sonhando sempre eu não tinha sonhado
Que n’esta vida sonha-se acordado,
Que n’este mundo a sonhar se vive!

Autor: Fernando Pessoa
Livro: Poesias ocultistas pg. 45

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

QUASE ACREDITEI...



Quase acreditei...

Que não era nada, ao me tratarem como nada.
Quase acreditei...
Que não seria capaz, quando não me chamavam, por acharem que eu não era capaz.

Quase acreditei...
Que não sabia, quando não me perguntavam por acharem que eu não sabia.
E tenho como dívida com a vida fazer com que cada ser humano se perceba, se ame, se admire de si mesmo, como verdadeira fonte de riqueza.
Foi assim que cresci: acreditando sou exatamente do tamanho de cada ser humano. E por acreditar perdi o medo de dizer, de falar, participar e até de cometer enganos.
E se errar?
Paciência, continuo vivendo, e por isso aprendendo.
PORQUE ERRAR É HUMANO...
Quase acreditei ser diferente entre tantos iguais, entre tantos capazes e sabidos, entre tantos que eram chamados e escolhidos.
Quase acreditei estar de fora quando me deixavam de fora por que... que falta fazia?
E de quase acreditar adoeci; busquei ajuda com doutores, mestres, magos e querubins. Procurei a cura em toda parte e ela estava tão perto de mim...
Me ensinaram a olhar para dentro de mim mesmo e perceber que sou exatamente, como os iguais que me faziam diferente.
E acreditei profundamente em mim.

(Desc. o autor)


terça-feira, 25 de setembro de 2012

ESTE BLOG SAÚDA A PRIMAVERA!!!!!

"A primavera chegará, mesmo que ninguém mais saiba seu nome, nem acredite no calendário, nem possua jardim para recebê-la. A inclinação do sol vai marcando outras sombras; e os habitantes da mata, essas criaturas naturais que ainda circulam pelo ar e pelo chão, começam a preparar sua vida para a primavera que chega.

Finos clarins que não ouvimos devem soar por dentro da terra, nesse mundo confidencial das raízes, — e arautos sutis acordarão as cores e os perfumes e a alegria de nascer, no espírito das flores.

Há bosques de rododendros que eram verdes e já estão todos cor-de-rosa, como os palácios de Jeipur. Vozes novas de passarinhos começam a ensaiar as árias tradicionais de sua nação. Pequenas borboletas brancas e amarelas apressam-se pelos ares, — e certamente conversam: mas tão baixinho que não se entende.

Oh! Primaveras distantes, depois do branco e deserto inverno, quando as amendoeiras inauguram suas flores, alegremente, e todos os olhos procuram pelo céu o primeiro raio de sol.

Esta é uma primavera diferente, com as matas intactas, as árvores cobertas de folhas, — e só os poetas, entre os humanos, sabem que uma Deusa chega, coroada de flores, com vestidos bordados de flores, com os braços carregados de flores, e vem dançar neste mundo cálido, de incessante luz.

Mas é certo que a primavera chega. É certo que a vida não se esquece, e a terra maternalmente se enfeita para as festas da sua perpetuação.

Algum dia, talvez, nada mais vai ser assim. Algum dia, talvez, os homens terão a primavera que desejarem, no momento que quiserem, independentes deste ritmo, desta ordem, deste movimento do céu. E os pássaros serão outros, com outros cantos e outros hábitos, — e os ouvidos que por acaso os ouvirem não terão nada mais com tudo aquilo que, outrora se entendeu e amou.

Enquanto há primavera, esta primavera natural, prestemos atenção ao sussurro dos passarinhos novos, que dão beijinhos para o ar azul. Escutemos estas vozes que andam nas árvores, caminhemos por estas estradas que ainda conservam seus sentimentos antigos: lentamente estão sendo tecidos os manacás roxos e brancos; e a eufórbia se vai tornando pulquérrima, em cada coroa vermelha que desdobra. Os casulos brancos das gardênias ainda estão sendo enrolados em redor do perfume. E flores agrestes acordam com suas roupas de chita multicor.

Tudo isto para brilhar um instante, apenas, para ser lançado ao vento, — por fidelidade à obscura semente, ao que vem, na rotação da eternidade. Saudemos a primavera, dona da vida — e efêmera."
                                                                Cecília Meirelles


LOUVOR DE MARIA

O coração humano, carne e sangue por natureza, já por si mesmo é atrevido, mais ainda quando ele tem poder, bens e honra. Isso representa um favor poderoso que empurra o coração humano ainda mais para a ousadia e a falsa segurança, esquecendo Deus e desprezando seus súditos. Com espaço para fazer o mal sem receber castigo, ele continua e vira fera, seguindo apenas sua própria vontade. Pelo nome é uma autoridade, mas conforme seu comportamento é um monstro. O sábio Bias tem razão ao firmar: “O exercício do poder revela o tipo de pessoa que alguém é”. Os súditos não têm coragem para se manifestar porque têm medo da autoridade. Por isso é necessário que todos os superiores temam a Deus e suas obras. Devem reconhecer bem Deus e suas obras e ser prestativos, como diz São Paulo em Romanos 12.8:
“quem governa seja solícito do orgulho e da vaidade”.
 Ora, não lembro nada das Escrituras que sirva melhor contra do que o cântico sagrado da bendita mãe de Deus. Sem dúvida, todos os que quiserem governar bem e ser boas autoridade devem aprender bem e guardar na memória aquele cântico. Certamente na memória o temor de Deus canta, de forma lindíssima, que Senhor ele é, especialmente quais são suas obras nas classes superiores e inferiores. Que outro escute sua amada que canta uma canção mundana. Porém, um príncipe dá ouvidos a esta virgem pura que lhe canta um hino espiritual, puro, edificante. Também não tem nada de impróprio o costume de cantar este cântico diariamente em todas as igrejas, na oração vespertina, com uma melodia especialmente adequada, diferente de outros hinos.
 Queira essa doce mãe de Deus conquistar para mim o espírito capaz de interpretar de forma proveitosa e profunda esta cântico. Assim Vossa Alteza e todos nós podemos compreendê-lo bem e ter uma ida louvável para que, na vida eterna, possamos louvar e cantar esse Magnificat eterno. Que Deus nos ajude. Amém.

Autor:Martim Lutero
Livro: Louvor de Maria pg.8,9-10
O texto foi escrito em 1521 e se constitui um modelo
de piedade de compreensão evangélica sobre Maria SS.  

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

ARAGUAIA- MARCELO BARRA


Longas noites, madrugadas
Quanta beleza pra um só lugar
Água limpa a se perder
Não, não volta nunca mais

Lentamente no abandono
Uma estrela atravessou o céu
Encena um tema de ternura
Um pesadelo da razão

Meu Araguaia
Suas areias cobriram meus pés
Seu encanto fez do pranto
Um acalanto pra nós dois

E na rede ensimesmado
Sonho sonhos que já estão em mim
Sinto a vida que eu levo aqui
Não esqueço nunca mais.

A DOR, UMA PEDAGOGIA




Um pinheiro solitário na planície infinita é um espetáculo. Saiu para a vida timidamente, quase por acaso, embalado pelos ventos. Os temporais balançam sem dó sua frágil cabeleira e, para não sucumbir, suas raízes penetram fundo no solo argiloso. Adquiriu tamanha consistência que hoje não há furacão que possa dobrá-lo. Lá está galhardo, na altura.
Em um brilhante jogo de paradoxos, Paulo transmite-nos a dialética cristã da fora-fraqueza: é na fraqueza humana que se enxerta, se prende e contrasta a força de Deus. Quem quiser viver, tem que morrer. Para transformar-se numa espiga dourada, o grão de trigo tem que apodrecer e ser sepultado no seio da terra. A força nasce da fraqueza, a vida da morte, a consolação da desolação, a maturidade das privações.
Quem não sofreu, parece uma vara de bambu: não tem miolo. Não sabe nada. Um grande sofrimento é como uma tempestade que devasta e arrasa vasta região. Passada a prova, a paisagem reluz cheia de calma e de serenidade.

Livro: Sofrimento e Paz – Para uma libertação pessoal pág. 181-182
Autor: Inácio Larrañaga



UMA ÉTICA PARA NOSSO TEMPO



Há trinta ou quarenta anos, um jovem ou uma jovem que sentisse impulsos de generosidade encerrava-se em um convento, ingressava em um seminário ou ia para as missões. Hoje, os jovens que tem inquietudes desse tipo dirigem-se a uma ONG, ou partem como voluntários para países de Terceiro Mundo, ou se põem a restaurar as moradias inabitáveis das pessoas mais desamparadas, que abundam em nossas grandes cidades. Vai-se extinguindo a velha preocupação pela pureza e pela piedade de outrora, ao mesmo tempo em que se potencializa uma nova sensibilidade. Nem mais, nem menos que a mesma sensibilidade que teve, segundo os evangelhos, Jesus, o Nazareno. A sensibilidade pelas vítimas deste mundo.
Verdade é que, infelizmente, muitas vezes se faz mal uso de tal sensibilidade. Estamos presenciando isso diariamente. “Embora haja vítimas em geral, as mais interessantes são sempre as que nos permitem condenar nossos vizinhos, os quais, por sua vez, agem do mesmo modo conosco e se recordam, principalmente, daquelas vítimas pelas quais utilizamos até o sofrimento das vítimas para tirar vantagem daqueles que consideramos adversários. O doloroso espetáculo dado por alguns políticos nesse sentido é algo que dá vergonha e até difícil de suportar.

Livro: A Ética de Cristo  pág. 105-106
Autor: José M. Castilho

domingo, 23 de setembro de 2012

LIBERDADE EMBARAÇADA




Puxo essas linhas trazendo alguns exemplos  de nossas leis que resguardam uma das mais valiosas peças de nossa democracia – a liberdade de imprensa.
De acordo com a Constituição Federal: “Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social. E também, que: “É verdade toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.
Mesmo sob intensa luz constitucional, os passos jornalísticos no Brasil ainda esbarram em situações turvadas por doutrinas autoritárias. Por exemplo, passado recente pôs-me a captar imagens de cenário surgido a partir do capotamento de uma viatura do Batalhão de Choque da Polícia militar de Goiás, no Parque Amazônia, que deixou ao chão dois policiais e um motociclista; este teve sua vida cessada no décimo sexto dia de luta hospitalar.
Eu? Não deu outra: tive embaraçados meus direitos constitucionais de levantar informações jornalísticas naquele espaço público, comum, que em minutos ficou parecendo ser parte do próprio quartel daquela força especial.
O tolher da liberdade de imprensa, partindo de agentes públicos de segurança, o que não é novidade, é um esbofeteio na própria Constituição. Todavia há situações em que essa imprensa – ora tolhida – é agilmente evocada por esses agentes para alcançar visibilidade a ações policiais autoconsideradas.
confortáveis.
É assim: por natureza de ofício, sempre existirão desagrados entre jornalistas e polícia. Porém, o que se deve levar em conta é que os dois têm limites funcionais impostos por lei. O primeiro deve entender e respeitar esses limites, mesmo porque não se produz conteúdo jornalístico digno de confiança se esse não tiver a lei como limite. A lei. Não o autoritarismo. Da mesma forma uma polícia só consegue estima junto à população quando essa de pronto a identifica como promotora exemplar dos princípios legais, morais e sócias.

Jornal O Popular
Autor: Diomício Gomes




MILAGRE


O milagre da vida
Como um jorro de veias
Abertas,
De rios abertos,
De céu ardendo
Em todos os tons de azul.

A vida em sua absoluta
Simplicidade
De casulo e borboleta:
Um fio de água nasce
Da pedra,
um vôo de águia
inventa a intensa
liberdade.

Como quem busca água
Fria e sonora
No poço atrás da casa,
Possuir apenas o essencial,
Possuir
Não o pássaro, mas o seu vôo,
Não os peixes,
Mas o rumo do rio.

E tudo pode ser
Felicidade e entrega.

Livro: Um Deus para 2000  pág. 29
Autor: Juan Arias
Autora da  poesia:  Roseana Murray

FIO




Há que recuperar o linho grosso
Do silêncio.
Sua trama e trigo,
Os caminhos solitários do silêncio,
Habituados pela memória.

E a vasta seda quase em ruínas
Dos mares
Onde a lua se faz peixe,
Há que recuperá-la,
Barco por barco ,fio por fio,
Para poder sonhá-la outra vez.

que recuperar o pão repartido,
O mapa escrito na pele do outro,
Sua intimidade e partitura,
Feito com o mesmo tecido das estrelas.

E então, diante do fogo reinventado,
Diante do sol, do vento e da chuva,
Estender as mãos.

Autora: Roseana Murray
Texto: Um DEUS para 2000
Autor:Juan Arias.

sábado, 22 de setembro de 2012

MALABARES (Espetáculos)



As palavras são os malabares
do poeta,
Os veleiros perdidos para sempre,
Noite adentro,
Tempo adentro.

Às vezes por um momento
Suas âncoras pousam
Na pele
E tudo pode ser dito:
Água, lua, pedra,
Um poço onde
Um rosto antigo navega.

Para que flutuem
Apenas um sopro
Quando se abre a janela
E os pássaros trazendo vento.

Entre as palavras ausentes
Invento teu nome como o grito
Da primeira luz.


A vida é precário equilíbrio.

Livro: Um Deus para 2000  pág. 59
Autor: Juan Arias
Poesia de ROSEANA MURRAY

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

AS NÚPCIAS E A VIDA SOCIAL E FAMILIAR



Antigamente as pessoas buscavam o sentido da vida a partir das duas grandes instituições: a religião e a família. Agora, no entanto, estamos vivendo uma mudança pela qual a relação institucional está sendo substituída pela relação pessoal. O que dá sentido à vida das pessoas não é a instituição a que cada qual está vinculada, mas as pessoas com as quais se relaciona. Assim sendo, para buscar um sentido para a vida, o fator determinante é cada dia menos a relação institucional (religiosa, familiar...) e é cada dia mais a relação baseada na “comunicação emocional” em que as recompensas derivadas dela são a base primordial para que tal comunicação se mantenha. Ao afirmar isso, estamos falando do que, com razão, foi denominado “relação pura”, que se baseia na comunicação, de tal forma que entender o ponto de vista da outra pessoa é o essencial. Por isso, o casamento está em crise e ter um parceiro está no auge. Porque o casamento se baseia na relação institucional, enquanto ter um parceiro tem sua razão de ser na relação pessoal, vale dizer, na comunicação emocional, ou, com outras palavras, na relação pura. E, por isso mesmo, também a religião está em crise. A pertença à religião foi vivida, pelo menos até agora, como pertença a uma instituição, coisa que hoje muitas pessoas não aceitam e preferem viver suas crenças religiosas “como livres” à margem de toda instituição.
Pois bem, isso tudo é o que hoje desconcerta a todos nós. E é o mesmo que desconcertou a sociedade da Galileia e da Judéia no tempo de Jesus. O fato desconcertante está em que Jesus foi muito crítico precisamente com as duas mesmas instituições que hoje estão em crise. Jesus foi crítico com a religião. E teve, por isso, muitos conflitos com os dirigentes religiosos, a ponto de, como bem sabemos, a religião acabar com Jesus e terminar condenando-o à morte da pior maneira. É igualmente certo que Jesus adotou uma atitude sumamente crítica com o modelo de família que configurava o tecido social daquele tempo. Refiro-me à família “patriarcal”.

Livro: A ética de Cristo   pág. 09-10
Autor: José M. Castillo

DEFENSOR DOS ÚLTIMOS




·        O perdão oferecido por Jesus

Jesus entende e vive as refeições com pecadores como um processo de cura. Ao ver-se acusado por causa de sua conduta estranha e provocativa, responde com o seguinte refrão: “Não são os que têm saúde que precisam de médico, e sim os enfermos.Aprendei de uma vez o que significa MISERICORDIA EU QUERO NÃO SACRIFÍCIOS”.
 Estas refeições têm um caráter terapêutico. Nelas Jesus lhes oferece sua confiança e amizade, liberta-os da vergonha e da humilhação, resgata-os da marginalização, acolhe-os como amigos. Pouco a pouco desperta neles o sentido da própria dignidade: não merecem nenhuma rejeição. Pela primeira vez sentem-se acolhidos por um homem de Deus. Doravante sua vida pode ser diferente.
Por isso suas refeições são alegres e festivas. Bebe-se vinho e provavelmente entoam-se cantos. No íntimo de seu coração, Jesus celebra com alegria o retorno dos “perdidos” à comunhão com o Pai. Também eles são filhos e filhas de Abraão. A alegria de Jesus contagia a todos. Não se pode ficar triste em sua companhia. É tão absurdo como estar jejuando junto ao noivo durante as bodas. Evidentemente, não são banquetes de caráter dionisíaco, como os que talvez ocorriam em Séforis ou Tiberíades. Jesus não convida à libertinagem. Não justifica o pecado, nem a corrupção, nem a prostituição. O que ELE faz é romper o círculo diabólico da discriminação, abrindo um espaço novo para o encontro amistoso com Deus.
Jesus senta-se à mesa com os pecadores não como juiz severo, mas como amigo acolhedor. O reino de Deus é graça antes que juízo. Deus é uma boa notícia, não uma ameaça. Os pecadores e as prostitutas podem alegrar-se, beber vinho e cantar junto com Jesus. Estas refeições são um autêntico “milagre” que os vai curando por dentro.


Livro: Jesus, Aproximação Histórica – pág. 247-248
Autor: José Antônio Pagola