Força para viver
Sua posição de autoridade absoluta e indiscutível no meio de uma sociedade de cristandade levou a Igreja, de maneira mais ou menos consciente, a propor a fé como um dever enquadrado num sistema de leis e proibições. Ainda hoje não poucos praticantes entendem e vivem sua religião como uma “obrigação”.
Esta percepção enviesada da fé contribuiu para gerar um tipo de cristão sem criatividade nem paixão, que “cumpre seus deveres religiosos”, mas não sente desejo de Deus. A estes se referia Simone Weil em sua penetrante observação: “Onde falta o desejo de encontrar-se com Deus, ali não há crentes, mas pobres caricaturas de pessoas que se dirigem a Deus por medo ou por interesse”.
No entanto, se escuta até o fundo a desafeição que alguns sentem para com o religioso, não é difícil observar que o que eles rejeitam não é Deus, mas uma ideia sufocante da religião que parece cercear sua liberdade e abafar o desejo natural que há neles de viver plenamente. Dificilmente o homem ou a mulher de hoje aceitarão uma fé proposta como um “imperativo” que priva do gosto de viver.
Lamentavelmente esquece-se que Deus é, antes de mais nada, o “Amigo da vida” aquele que deseja e busca sempre uma vida mais digna e feliz para todo ser humano e para a criação inteira. Esquece-se que Deus não é controlador de um código de proibições e preceitos, mas fonte e estímulo de vida mais coerentes e sadia, mais gratificante e unificada.
Os bispos da França vêm acentuando, de alguns anos para cá, que “o Evangelho de Cristo é esperado hoje de maneira nova: como uma força para viver”. Isso é verdade. O Evangelho é, antes de mais nada, “uma força para viver”., e só será ouvido por pessoas que andam buscando razões para viver, para amar a vida e para desfrutá-la de maneira sensata e responsável.
No relato evangélico, Jesus se define em casa de Zaqueu como alguém “que veio procurar e salvar o que estava perdido”. Não devemos esquecer isto. O Deus cristão é um Deus que procura reavivar e reconstruir o que nós podemos estragar e pôr a perder. Deus não é carga pesada, mas vigor e estímulo para viver corretamente.
Livro: O caminho aberto por Jesus
Autor: José Antonio Pagola
Pg. 314/315
Nenhum comentário:
Postar um comentário