A vida ensina
Eu sempre me frustrei com as jabuticabas que ficavam lá na ponta dos galhos, longe das minhas mãos: as mais doces, abandonadas aos marimbondos e aos pássaros. O desejo era forte, mas a inteligência não tinha imaginação. A única solução que ela me oferecia era subir até a ponta dos galhos. Mas eu já não sou tão jovem e leve. Meu corpo, ferramenta, já não se presta para tais proezas. Mas a inteligência do seu João, amigo em primeiro lugar e pedreiro em segundo, tinha mais imaginação que a minha: “É só usar um tubo de PVC”. Não entendi. Aí, ele pegou um tubo de PVC, levou sua ponta oca até uma gorda jabuticaba, cutucou-a, ela se soltou, desceu por dentro do tubo pela força da gravidade para cair na mão que a esperava e que, ato contínuo, levou-a à boca.
O tubo de PVC não foi feito para apanhar jabuticabas. Mas a inteligência descobriu nele uma ferramenta não imaginada por aqueles que o fabricam.
Autor: Rubem Alves
Livro: Variações sobre o prazer
Pg.95
Nenhum comentário:
Postar um comentário