No livro, ninguém
é normal
O manual Diagnóstico e Estatístico
de Transtorno Mentais já balizou os tratamentos psicológicos em todo o mundo.
Hoje, é visto com desconfiança – até por quem já o redigiu.
Na bucólica Itaguaí do doutor Simão
Bacamarte, aos poucos quase todos os habitantes foram sendo recolhidos à Casa
Verde – o hospício do psiquiatra criado por Machado de Assis, em o Alienista. Até que
- atenção, contém spoilers -, o próprio Bacamarte acredita estar maluco, se
interna e morre solitário.
Allen Francês não chegou a esse
ponto. Mas como um dos psiquiatras que participaram da redação da quarta edição
do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM, na Sigla em
inglês), digamos que ele trilhou uma estrada parecida. O manual feito pela
Associação Americana de Psiquiatria (APA) baliza tratamentos n mundo todo desde
a década de 1950 – e amplia a cada edição a quantidade de transtornos. Na
primeira edição, em 1952, eram 106. Na quinta, a atual, são 51 a mais. Após o lançamento
da última edição, Frances contra - atacou com o livro Saving Normal: (Salvando
o Normal, sem edição brasileira). Em entrevista a SUPER, o médico disse que a
nova edição da bíblia dos psicólogos e psiquiatras traz diagnósticos e
tratamentos desnecessários.
“O DSM – 5 deixa o cenário pior
por expandir ainda mais os limites da psiquiatria, no sentido de que logo ninguém
será normal.
Dificilmente um exemplar do DSM
estará ao seu alcance, leitor leigo, numa sala de espera. Mas, se um dia o livrão
cair em suas mãos, não se assuste: você provavelmente se identificará com
algum(ns) do 157 transtornos mentais dissecados pelas páginas dele. Lá estão os
clássicos, como a esquizofrenia, bipolaridade, transtorno obsessivo-compulsivo
(TOC), paranoia, borderline. Mas são as novidades
que causam desconforto entre os especialistas. Uma delas é o Transtorno
Disruptivo de Desregulação do Humor, um novo nome para a velha birra: define
crianças que agem com irritação após serem contrariadas e têm episódios de
descontrole do humor. Outro alvo de críticas é a inclusão do luto como um
sintoma da depressão – afinal quem não fica triste quando perde alguém? A
identificação desses transtornos acaba aumentando a quantidade de diagnósticos –
e o consequente uso de tarjas pretas.
Aí choveram acusações de que os
responsáveis pela publicação estariam defendendo os interesses da indústria
farmacêutica.
Revista: O Guia da Psicologia /Agosto de 2014.
Autora: Bruna Reis
Nenhum comentário:
Postar um comentário