Águas profundas
A crise da Petrobras já é a maior desde o estouro do mensalão. O que aconteceu, até agora, mesmo sem saber a evolução, criou uma zona de sombra sobre negócios públicos que assusta pela dimensão. O ex-diretor Paulo Roberto Costa esteve nos governos Lula e parte do governo Dilma em uma diretoria poderosa, assumiu a presidência várias vezes. Hoje, na cadeia, conta o que sabe.
É doloroso para qualquer brasileiro ver a
maior empresa do país, com sua história, tradição e competência,
mergulhada nas águas profundas das comissões cobradas em negócios
superfaturados e em distribuição de propinas. Há uma grande chance — e
tomara que ela se confirme — de que não seja generalizado, mas um foco
de corrupção, felizmente detectado pela Polícia Federal.
A empresa
é a empresa. Continua fazendo seu trabalho, pesquisas futuristas no
Cenpes, os embarcados passam duas semanas seguidas no meio da mar, as
plataformas continuam achando novas reservas de petróleo, e novas formas
de prospectá-lo. A Petrobras não pode ser confundida com o que andou
acontecendo de obscuro nas transações cujos fios aparecem agora.
As
histórias que começam a aparecer são tenebrosas e evidentemente não
estão circunscritas a dois diretores. Provavelmente, há o concurso de
mais gente dentro da empresa e políticos fora da estatal. Uma empresa
deste tamanho tem um volume tão assombroso de contratos, fornecedores,
compras, que só um sistema de muita transparência, vigilância e
prestação de contas pode proteger o contribuinte e os acionistas dos
desvios. Quando é um caso isolado, resolve-se com demissões; quando é um
foco que parece ter se espalhado pela cúpula do poder em Brasília, é um
escândalo a ser investigado, julgado e punido exemplarmente; quando é
uma corrupção endêmica, é desesperador. Os sinais não confirmam a
terceira, e pior, hipótese.
Até agora, todos os indícios são de um
foco de negociatas, e o avanço, com a delação premiada de Paulo Roberto
Costa, é a lista dos beneficiados. É preciso até mais do que as
declarações dele, mas é bom lembrar que se o que o faz falar é a
esperança de redução da pena — de não virar um Marcos Valério, que em
breve estará sozinho na cadeia — ele precisará dizer a verdade.
A
Petrobras tem outro problema derivado das opções de política energética
feitas pelo governo, e que a essa altura parece o de menos. Mas produziu
um aumento do nível de endividamento em relação à geração de caixa que a
leva para o caminho da redução da classificação de risco, com danos
pesados, inclusive aumento do custo dos financiamentos externos. Isso
pode ser corrigido se no próximo governo — ou no próximo mandato —
houver alteração dos rumos adotados até agora. Não é fácil, no entanto,
pelo impacto desse ajuste na inflação.
Política equivocada
resolve-se com uma transição para uma nova diretriz. O que realmente
pesa sobre o país neste momento é algo muito pior. Pela informação de
Rodrigo Rangel, na “Veja”, o que Costa teria dito até agora envolveria
três governadores, seis senadores, um ministro de Estado e 25 deputados.
Na lista, estão os presidentes das duas Casas do Legislativo Federal.
Como um dos governadores não pode mais se defender, e seu nome permanece
como um dos pivôs eleitorais, todo o cuidado é pouco na divulgação das
acusações.
A grande esperança em relação ao mensalão era que o
difícil processo trouxesse um constrangimento aos corruptos e
corruptores. Pelo visto, parece não ter sido suficiente. Se o que está
sendo dito for confirmado, o país passará por outro período de exposição
das vísceras, e o que se espera é que a Procuradoria da República e o
Supremo Tribunal Federal se dediquem da mesma forma como se dedicaram ao
caso do mensalão.
Até agora, de concreto, tem-se o ex-diretor
preso e falando dentro do processo de delação premiada, e alguns
negócios muito mal explicados, como a compra da refinaria de Pasadena
por um preço muito maior do que havia sido comprada tempos antes, e
outra refinaria que teve seu custo inicial multiplicado.
Diante do
que já se sabe, a presidente não pode acusar seus adversários políticos
de ameaçarem a estatal. O que pesa sobre a Petrobras agora aconteceu
nos três últimos mandatos presidenciais.
Míriam Leitão
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