Dum dum no cemitério
Dois padres novos, colegas de seminário, foram a um povoado
para desobriga na época da páscoa.
Depois de atender confissões e tomar um lanche, dois bons
paroquianos mostraram-lhes os quartos onde passariam a noite. Uns quinhentos metros
atrás da capela, ao lado do cemitério local.
Mostraram a bacia de água para se lavar e para estranheza
dos padrecos uma vasilha com sabugos, eram o papel higiênico. Antes de dormir
procuraram o lavatório. Um deles saiu com vela e foi procurar. Voltou depois de
usar o lavatório e ensinou o caminho para o companheiro. Você atravessa o
cemitério e encontrará a latrina. É uma fossa com tábuas cobrindo. Leve sabugos
se precisar. O companheiro ficou admirado da coragem do bandeirante que
descobriu a mina. Pensou bem e disse: Amanhã eu vou fazer minhas necessidades.
Urinar, eu vou ali ao lado e faço como cachorro.
Apagadas as velas, barulho de morcegos... e agora esses
bichos vão nos chupar sangue? Um deles, tirando a lição de sua vida na roça,
viu uma vara de pescar e começou a agitar. Pelo menos três morcegos caíram
mortos. Afinal era preciso dormir. Vamos fingir que não ouvimos nada. Mas na
janela havia sim um barulho constante que não era de batida. Ignoramos. O sono
era pesado. Um batido insistente bem mais tarde obrigou os hóspedes a levantar
depois de noite mal dormida. Eram já sete horas da manhã e a missa era às sete
e meia e já havia gente esperando os padres na igreja.
E a higiene matinal? Agora o sol já nascera, os mortos não
iriam incomodar, o caminho do dum-dum podia ser usado sem medo. Foi o que foi
feito pelo outro padre prudente que não se arriscara a visitar o cemitério de
noite e se aguentou até o dia clarear e ter certeza que os mortos estavam todos
enterrados.
Procurando saber a
causa do barulho noturno na janela ficaram sabendo que um cavalo havia se
coçado lá. Não havia mula sem cabeça...
Senhores, tudo isso eu vi e senti; eu era um desses padres
aqui descritos!
Contos de Paulo Motta
Livro: Memórias de um seminarista
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