sábado, 5 de outubro de 2013

Um Cineasta da Vida


 

Os filmes de Manoelzinho lembram como anunciava os filmes exibidos em Mantenópolis, no Espírito Santo. Desde os oito anos, quando descobriu o cinema da cidade, fez bico como divulgador durante o dia para ganhar uma câmera e ter suas próprias propagandas pelas ruas como cineasta – diretor, roteirista e ator ao mesmo tempo!... Certo dia de 1987, um garoto passou de bicicleta espalhando pelo município capixaba: “Não percam logo mais um sensacional filme de Manoel Loreno!.
A primeira história do servente de pedreiro e agricultor lotou o ginásio naquela tarde. Isso tudo sem telão. Boa parte dos 15 mil habitantes do município (ele estima “umas duas mil pessoas”) se dividiu entre duas televisões para assistir ao thriller “ A Vingança de Loreno”. Ninguém ligou que as cenas noturnas fossem gravadas com sol forte, que trabalhadores da roça fizessem as vezes de atores, que o sangue fosse “quissuco” ou que as assombrações usassem máscaras infantis. No fim, todos ficavam na quadra até o filme passar de novo.
Manoel Loreno continuou filmando e vendendo as fitas pela
Cidade .São cerca de 40 títulos, como “A Maldição da Casa de Vanirim”, “O Espantalho Assassino” ou “A Gripe do Frango”, sempre ambientados em terras estrangeiras, geralmente “Maiamis” e “Uóchinton”. O único equipamento que seu Manoelzinho possuia, além da velha câmera VHS, era um gravador para a sonoplastia. Com ele, soltva barulho de telefone, de tiro e toca a trilha sonora nos momentos certos durante a gravação.
Na sombra de uma árvore, sempre a mesma, o cineasta desenhava as
cenas, já que nunca aprendera a escrever. Para as filmagens, convocava atores voluntários e, na hora, definia o papel de cada um: capanga ou bandido, se for faroeste; zumbi ou vítima, se for de assombração. “Nunca faltava para ninguém, “faço cenas para todo mundo participar.” O único ator predefinido era ele mesmo: “Os bandidos morriam todos, o mocinho ficava até o final da fita”.
       Segundo a jornalista Eliane Brum, o que se contava nos filmes de seu Manoelzinho, além do enredo, “é o improviso que a vida nos exige, obrigando-nos a uma constante reinvenção do roteiro previsto e sempre fadado ao fracasso”.
       Bernadette Lyra, uma das curadoras da mostra paulistana Cinema de Bordas, faz análise parecida: “Não é o movimento coerente da história que interessa a ele, mas sim o movimento da vida”. Sem contar teorias filosóficas e estéticas amador é simples: divertir as pessoas. E a si próprio.


Revista: Brasil N°163 Ano 14 Pg. 7

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